É impossível guardar toda a informação que recebemos e não seria desejável que mantivéssemos toda a informação que conseguimos codificar e receber. Esquecer é importante: a sobrecarga mnésica – tipo homem que nunca esquece quase nada – transformaria a vida num fardo insuportável, tornando-nos escravos dos factos e dos dados.
Pode-se pensar que as capacidades de S. seriam muito práticas, mas via nelas, muitas vezes, uma séria contrariedade. Mudava de emprego para emprego, sentindo-se muitas vezes sobrecarregado pela quantidade de detalhes que automaticamente o envolviam em cada uma das suas tarefas. A sua tendência para criar imagens visuais interferia com o processamento normal da informação. Tinha dificuldades em compreender todas as passagens de um texto porque se atrapalhava nos seus detalhes. Para um observador casual, S. parecia ser desorganizado e algo tolo – uma pessoa que falava demais e que estragava qualquer conversa social descrevendo imagens que surgiam sem nexo na sua mente. Por ironia, tinha uma memória muito pobre para factos, achando-os demasiado flexíveis e fluidos para serem recordados. Pior ainda, sentia-se como sendo duas pessoas. Descrevia-se a si mesmo como «eu» quando controlava a sua memória e como «ele» quando a sua imaginação lhe escapava. Luria concluiu que S. tinha dificuldades em saber qual o aspecto mais real da sua vida: «o mundo da imaginação no qual vivia, ou o mundo da realidade no qual era apenas convidado temporário»”.
RODRIGUES, Luis, Psicologia 12º ano, vol. 1, Plátano Editora
Para o provar, eis a verdadeira história de S. (na realidade o russo Cherechevski), o homem com demasiada memória.
“Ao contrário de outros repórteres, S. nunca tomava notas quando ouvia o seu editor dar instruções detalhadas. Exasperado pelo que pensou ser falta de atenção da parte de S., o editor desafiou o seu profissionalismo. Mas ficou espantado quando S. reportou não só os detalhes das suas instruções para a sua própria tarefa, como também os detalhes de instruções dadas aos outros. S. também estava surpreendido. Pensava que a memória de todas as pessoas funcionava da mesma maneira e, até esse momento, nunca tinha pensado em si mesmo como diferente ou especial.
O psicólogo russo Alexander Luria estudou o caso de S, cuja imaginação visual única lhe permitiu lembrar-se de uma extraordinária quantidade de detalhes. Luria conheceu S. em 1920 na Rússia. Começou com algumas experiências simples para testar a memória de S. pedindo-lhe para se lembrar de séries de palavras, o método padrão para testar a capacidade de memorização. Luria concluiu que a memória de S. aparentava não ter limites. Em tais testes a maioria das pessoas lembrar-se-iam, no melhor dos casos, de 5 a 9 números. S. não só era capaz de se lembrar de 70 números, mas podia também dizê-los correctamente na ordem inversa. S. também podia relatar a sequência sem falhas e sem aviso ou prática – mesmo 15 anos após o seu contacto original com a sequência! Mais ainda, S. podia descrever o que Luria tinha vestido e onde esteve sentado enquanto aprendia a lista original. Façanhas de memorização semelhantes incluíram a reprodução exacta de textos de línguas que não conhecia, depois de ter ouvido a passagem uma única vez.
Como pôde S. realizar tais proezas? Desde que cada número ou palavra fosse enunciada lentamente, S. podia representá-la como uma imagem visual que tinha sentido para si. Essas imagens eram duráveis – S. lembrava-se facilmente da imagem que tinha criado para cada sequência muito tempo depois de ter aprendido esta. Para apagar uma imagem, ele realizava um ritual misterioso e específico.
Pode-se pensar que as capacidades de S. seriam muito práticas, mas via nelas, muitas vezes, uma séria contrariedade. Mudava de emprego para emprego, sentindo-se muitas vezes sobrecarregado pela quantidade de detalhes que automaticamente o envolviam em cada uma das suas tarefas. A sua tendência para criar imagens visuais interferia com o processamento normal da informação. Tinha dificuldades em compreender todas as passagens de um texto porque se atrapalhava nos seus detalhes. Para um observador casual, S. parecia ser desorganizado e algo tolo – uma pessoa que falava demais e que estragava qualquer conversa social descrevendo imagens que surgiam sem nexo na sua mente. Por ironia, tinha uma memória muito pobre para factos, achando-os demasiado flexíveis e fluidos para serem recordados. Pior ainda, sentia-se como sendo duas pessoas. Descrevia-se a si mesmo como «eu» quando controlava a sua memória e como «ele» quando a sua imaginação lhe escapava. Luria concluiu que S. tinha dificuldades em saber qual o aspecto mais
Pode-se pensar que as capacidades de S. seriam muito práticas, mas via nelas, muitas vezes, uma séria contrariedade. Mudava de emprego para emprego, sentindo-se muitas vezes sobrecarregado pela quantidade de detalhes que automaticamente o envolviam em cada uma das suas tarefas. A sua tendência para criar imagens visuais interferia com o processamento normal da informação. Tinha dificuldades em compreender todas as passagens de um texto porque se atrapalhava nos seus detalhes. Para um observador casual, S. parecia ser desorganizado e algo tolo – uma pessoa que falava demais e que estragava qualquer conversa social descrevendo imagens que surgiam sem nexo na sua mente. Por ironia, tinha uma memória muito pobre para factos, achando-os demasiado flexíveis e fluidos para serem recordados. Pior ainda, sentia-se como sendo duas pessoas. Descrevia-se a si mesmo como «eu» quando controlava a sua memória e como «ele» quando a sua imaginação lhe escapava. Luria concluiu que S. tinha dificuldades em saber qual o aspecto mais real da sua vida: «o mundo da imaginação no qual vivia, ou o mundo da realidade no qual era apenas convidado temporário»”.